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Hillsong:

Um novo modelo para a igreja cristã

Entre fumaça, LED e fé: Hillsong, Paredes Pretas e o novo gospel performático. Para muitos migrantes brasileiros na Oceania, a Hillsong virou mais que igreja: virou comunidade, identidade, acolhimento e até coaching de vida.

  

Por José Ildefonso*

De Taubaté-SP

Para Via Fanzine

25/05/2025

 

Adaptam seu roteiro para o solo tupiniquim, mas o que muda? Menos Sydney, mais BH. Menos paletó e gravata, mais camiseta oversized, tatuagem e barba bem feita.

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Você já entrou em uma igreja e achou que estava num festival de música indie, com estética de videoclipes e clima de TED Talk? Se sim, provavelmente pisou em um dos templos da Hillsong – ou, mais perto de casa, em uma das crescentes “igrejas das paredes pretas” espalhadas pelo Brasil.

 

De Sydney a São Paulo, de Brisbane a Brasília, uma nova liturgia do espetáculo vem redefinindo a forma como o sagrado se apresenta. A Hillsong, fenômeno global que funde fé, estética pop, branding religioso e consumo jovem, tem sido modelo e musa para essas igrejas brasileiras que decidiram trocar os vitrais coloridos por telões de LED, os púlpitos por palcos e os hinários por playlists afinadas no Spotify.

 

Mas o que está por trás desse fenômeno? Comecemos com a Hillsong. Fundada na Austrália, ela se tornou um hub transnacional de uma espiritualidade “cool”, onde o culto é dirigido como um show e a mensagem vem embalada por pop rock celestial, luz baixa, palavras de afirmação e pastores com visual GQ. Para muitos migrantes brasileiros na Oceania, a Hillsong virou mais que igreja: virou comunidade, identidade, acolhimento e até coaching de vida.

 

Só que por trás do neon há tensões. A igreja promove espaços de aparição – ambientes onde certas identidades são celebradas e outras, sutilmente domesticadas. A inclusão LGBTQIAPN+, por exemplo, muitas vezes se restringe à superfície estética, sem reverberar nas políticas internas. E não são raros os relatos de controle sobre aparência, tatuagens e contratos que precisam da assinatura dos pais – mesmo para estudantes adultos. Em meio ao discurso da graça, há também performance e vigilância.

 

Essa estética e essa lógica atravessaram o Pacífico e aportaram com força no Brasil. As chamadas “igrejas das paredes pretas” — um termo que surgiu meio na crítica, meio na autoafirmação — são espaços que se inspiram no modelo Hillsong, mas adaptam seu roteiro para o solo tupiniquim. O que muda? Menos Sydney, mais BH. Menos paletó e gravata, mais camiseta oversized, tatuagem e barba bem feita.

 

Por aqui, o culto virou experiência sensorial: som potente, luzes sincronizadas, direção de palco e uma estética visual que não deixa nada a dever aos clipes da Billie Eilish. O pastor se apresenta como mentor espiritual e influencer, mais próximo de um headliner do que de um sacerdote tradicional. A mensagem? Fé leve, performance intensa, excelência como regra.

 

Só que o Brasil não é a Austrália, e esse evangelho da performance também encontra seus conflitos por aqui. Muitos líderes dessas igrejas têm formação em agências de publicidade ou em comunicação digital, e usam os códigos da cultura pop para falar com uma juventude evangélica conectada, cansada do moralismo e ansiosa por pertencimento. Mas até que ponto esse movimento é libertador — e quando começa a repetir as mesmas exclusões com outra estética?

 

O “ser gospel” nas paredes pretas, como na Hillsong, não se restringe ao que se crê, mas ao que se veste, se posta, se ouve. O pertencimento passa por marcas, slogans e até o design da bio no Instagram. É uma teologia vestida de lifestyle. E, como toda marca, também produz suas tensões: há quem critique a pasteurização do evangelho e a gentrificação da espiritualidade, onde o “reteté” é considerado brega e o improviso, falha de produção.

 

Enquanto isso, o Hillsong College — quase uma escola de negócios da fé — forma líderes com foco em excelência e liderança global. No Brasil, líderes dessas novas igrejas passam a investir em cursos, mentorias e redes de influência. Estar na moda virou também uma forma de evangelizar — e de captar seguidores.

 

No fundo, Hillsong e paredes pretas compartilham a mesma aposta: que uma espiritualidade estética, performática e bem produzida pode ser o novo rosto do cristianismo contemporâneo. Um rosto que sorri nos vídeos bem editados, canta sobre graça em voz suave e se organiza como uma start-up celestial.

 

Mas resta a pergunta: nesse evangelho digital de fumaça, filtros e promessas, o que estamos realmente celebrando — e o que estamos deixando para trás?

 

* José Ildefonso é articulista, cronista e colaborador de Via Fanzine.

 

- Imagem: Criação do autor, utilizando IA.

 

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