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 entrevista

 

 

Entrevista com Luiz Carlos Sá

(cantor, compositor e instrumentista)

Por Pepe Chaves

Para Via Fanzine

Set/2008

 

Sá, Rodrix & Guarabyra

 

Luiz Carlos Pereira de Sá fez os primeiros estudos na Escola República Argentina e no Colégio Andrews, no Rio de Janeiro, onde nasceu. Se formou bacharel pela Faculdade de Direito Cândido Mendes. Integrante da dupla de compositores e cantores Sá & Guarabyra, realiza uma média de 150 shows anuais, pelo Brasil e exterior. Trabalhou na S/A Rádio Jornal do Brasil (programador de repertório, 68/71), Correio da Manhã (editor de som e música, 67/69), Pauta Grav. e Prop. Ltda. (sócio), TV Continental (produtor, 62/64). Foi crítico de música do encarte cultural O Sol, do Jornal dos Sports (64/66). Foi diretor de Criação e Áudio da Vice Versa. Faz parte da Associação de Músicos e Regentes do Brasil AMAR e da Ordem dos Músicos do Brasil. Criador de numerosos jingles de sucesso. Foi premiado por diversas vezes: com "Olivetti Natal" ganhou o Clio 75; com "Comind Natureza", o Clio 78. Com "Vem pra Caixa você também" e com "Só tem amor quem tem amor pra dar", ganhou vários prêmios. Autor de canções de sucesso, foi gravado por alguns dos maiores intérpretes da MPB, tais como, Luhli, Pery Ribeiro, MPB4, Ney Matogrosso, Gal Costa, Erasmo Carlos, Roupa Nova, Milton Nascimento, Quarteto Em Cy, Biquini Cavadão, Zizi Possi, Marina Lima, Simone, 14 Bis, Flávio Venturini, entre outros. Atualmente Luiz Carlos Sá reside na cidade de Belo Horizonte-MG.

 

Via Fanzine: Sá, além de músico você trabalhou em diversas outras atividades. É bacharel em Direito, publicitário, jornalista, produtor, tendo trabalhado em jornais, rádios e tevês do Brasil. Como é que tudo isso acabou por desaguar no campo musical?

Luiz Carlos Sá: A uma certa altura da vida, no final da adolescência, fiquei dividido e sem saber o que fazer de mim. Resolvi então tentar tudo. Fiz música, jornalismo, diplomacia, produção musical, propaganda, mas acabei por me fixar na carreira de cantor e compositor. Apesar de, ou por causa disso, nunca deixei de escrever que, aliás, é também uma questão de ritmo...

 

VF: Não me pergunte como sei disso, mas, nos “primórdios” de sua carreira, você integrou um grupo chamado Missão (com Paulo Thiago e da Soninha do Quarteto em Cy). A Missão participou de um memorável show com participação de Aracy de Almeida, Ismael Silva e o MPB-4. Juntos, vocês gravaram “Samba Pede Passagem” (Polydor/Philips), de autoria de Sidney Miller e Paulo Thiago, que protestava claramente a ditadura militar vigente, (“Olha só, meu povo, o dia te acordou, a rua é teu lugar, vem ver o sol nascer que o nosso Rio é todo uma canção, mas não, ninguém, ao acordar o sol, contente está”). Você sente saudades daquela época?

Sá: O grupo na realidade se chamava Grupo Mensagem, nome dado pelo Armando Costa e pelo Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha. “Missão” era o nome da música de Sidney Miller e Paulo Thiago incluída no LP com a trilha sonora do espetáculo, que se chamava “Samba Pede Passagem” e acabou por ser o passaporte para minha primeira fase profissional. Éramos cinco: eu, Soninha, Sidney Miller, Thiago e Marco Antonio Menezes. Além dos que você citou participavam também Padeirinho, Bidi, Baden Powell, a velha guarda da Portela e um regional com grandes músicos como Carlos Poyares, Dino 7 Cordas e muitos outros grandes nomes do samba de raiz da época. Foi para mim uma aula completa de sensibilidade e música.

 

VF: Seu talento como compositor cedo se destacou e você foi justamente reconhecido por grandes nomes da música naquela época, entre eles, o respeitável Peri Ribeiro, que, gravou sua canção “Giramundo” e viria abrir a porta de suas composições a inúmeros intérpretes. Como foi para você, naquela época (e, creio, ainda hoje), ter uma música gravada por um ícone da MPB como o Peri Ribeiro?

Sá: Eu era muito ingênuo e não tinha noção do que estava acontecendo. O Peri e o diretor musical da Odeon à época, Milton Miranda, foram os mentores de meu ingresso naquilo que me pareceu um universo complexo e – até certo ponto - decepcionante: o “show business”. Graças a esses dois “gurus”, pude entender que a música não era só criação, mas também significava aprender a gerenciar uma carreira. Sem o apoio desses dois amigos eu não teria entendido o significado da palavra “profissionalismo” no contexto idealista em que eu vivia. 

 

VF: Depois disso, você tocou num grupo chamado A Charanga, com Paulo Machado, entre outros, que participou do Festival Internacional da Canção (FIC) de 1970, com uma canção meio “interplanetária” (digamos assim) chamada “Milhões de Anos Luz Além”. Você pode nos relembrar uma parte da letra dessa canção e comentar sobre a participação de A Charanga nessa versão do FIC?

Sá: A música era pomposamente dedicada a Ray Bradbury, Isaac Asimov e Arthur Clarke. Eu era literalmente pirado em ficção científica. Dizia assim: “Toda a Terra espera o dia, a hora de falar, linguagens do Universo à gente que virá do espaço exterior, será ou por guerra ou por amor, gente de Sírius ou Alfa Centauro, milhões de Anos Luz além, levam os novos segredos da vida, milhões de Anos Luz Além...”. Claro que, apesar do bom arranjo vocal e instrumental, não comoveu ninguém e passou em branco no festival (risos). 

 

'Nada se compara a sentir esse tipo de impotência diante de uma força do Mal'

(Sobre torturas e mortes na ditadura brasileira)

 

VF: Logo depois, você ressurgiria como um inspirado autor de jingles publicitários, além de se projetar com o trio, o Sá, Rodrix & Guarabyra. Como você sintetiza a química de Luis Carlos Sá, Gutemberg Guarabyra e Zé Rodrix e como se iniciou a história musical de vocês?

Sá: Antes de compormos juntos, éramos amigos. Somos amigos há quase 40 anos, entre briguinhas, implicâncias e babaquices do gênero, que nunca conseguiram superar a admiração que sentimos pelos músicos e pessoas que somos. Nossa química é essa: nós gostamos de nós, gostamos de tocar e viajar juntos.

 

VF: Após lançar dois álbuns, Zé Rodrix saiu para fazer carreira solo em 1973 e o antigo trio passou a se apresentar e a gravar como a dupla Sá & Guarabyra. Naqueles tempos, diversos músicos no Brasil sofreram retaliações do governo militar. Você chegou a sentir o peso da censura militarista apenas por desempenhar seu trabalho musical?

Sá: Como todos nós dessa mesma tribo, dei minhas corridas da polícia. Mas, doloroso mesmo foi ter amigos mais engajados torturados, presos e às vezes mortos pela ditadura. Nada se compara a sentir esse tipo de impotência diante de uma força do Mal.

 

VF: O estilo da dupla Sá & Guarabyra iniciado com seu primeiro disco “Nunca”, foi rotulado de “rock rural”, pela introdução de temas do campo em suas letras, até mesmo instrumentos, mesclada aos recursos eletrônicos. Como você justifica o rock rural brasileiro? O estilo ficou limitado somente a Sá & Guarabyra ou as raízes chegaram aos frutos?

Sá: Quem deu o rótulo de rock rural foi a mídia, nós nunca quisemos rótulos. Tivemos que engolir esse, dada a dificuldade das pessoas – numa época em que tudo era tribal - em compreender que não estávamos filiados a nenhuma corrente. Acabamos por virar “pais” de um monte de coisas, umas boas, outras ruins. Mas é melhor ser pai que não ter filhos (risos).

 

'Hoje sou um anel carioca folheado a sertão'

(sobre sua relação com outros estados brasileiros)

 

VF: Você nasceu no Rio de Janeiro, mas criou fortes vínculos com a música de outros estados, sobretudo, com os compositores mineiros. Conte-nos um pouco de seu contato com os músicos de Minas e das felizes parcerias que deram à luz algumas das mais brilhantes canções da MPB.

Sá: Apesar de carioca – nós, cariocas, somos muito ligados em nosso próprio umbigo – sempre tive uma “visão exterior” ligada ao resto do Brasil. Meus pais viajavam muito pelos interiores de Minas, São Paulo e Rio, e isso, junto com as viagens que fiz com Guarabyra ao então ignoto e isolado sertão do São Francisco, me deram o necessário banho-Brasil. Hoje sou um anel carioca folheado a sertão.

 

VF: Em parceria com o Sérgio Magrão, do 14 Bis, você compôs a canção “Caçador de Mim”, gravada por diversos intérpretes. Dentro da temática exposta nessa canção, você já se encontrou?

Sá: Continuo me caçando com empenho e gosto.

 

VF: As canções “Espanhola”, (letra de Guarabyra) e “Garapuá” (letra de Sá) foram compostas em parceria com o mineiro Flávio Venturini. Você pode nos dizer quem é a espanhola e onde fica Garapuá?

Sá: A “Espanhola” existe e mora na Espanha (risos). Quando Flavinho me deu a melodia de “Garapuá”, onde nunca fui, ele me descreveu pormenorizadamente o lugar, em Morro de São Paulo, litoral da Bahia. Sempre fui meio médium dessas coisas. Quando fiz “Sobradinho” e “Trem de Pirapora” jamais tinha ido a Sobradinho ou Pirapora...

 

VF: “A primeira canção da estrada” e “O pó da estrada”, gravada nos anos 70 pelo trio SR&G são típicas canções hippies. Você chegou realmente a vivenciar esta vida de estrada, poeira na cara, de contracultura e de caroneiro, enfatizada nestas canções?

Sá: Sempre adorei dirigir e desde os 18 anos tinha carro e varava estradas. Minha posição foi mais de motorista que de caroneiro. Até hoje um dos meus maiores prazeres, senão o maior deles é cair na estrada, de preferência na direção. Hoje, meu Pajerão me leva onde quer que eu queira ir, sem grandes problemas de estrada... Mas sempre admirei a coragem dos caroneiros em sequer serem donos dos seus destinos, como nós, da direção, somos.

 

Beto Guedes, Guarabyra e Sá

 

VF: Você e Guarabyra compuseram uma “canção ufológica”, que é “Nave Louca”. Nela, é narrada a chegada de uma nave extraterrestre e o susto da população ao constatar o inusitado. Você acredita nessa possibilidade narrada em “Nave Louca”?

Sá: Bem, a Nave Louca é uma piada. Já o “Milhões de Anos Luz Além” que comentamos acima, era uma certeza. Entre a piada e a certeza não fico com nenhuma das duas (risos).

 

VF: Já avistou alguma vez já avistou UFO ou teve alguma experiência transcendental dessa natureza?

Sá: Não vi e nem acho que vá ver nenhuma dessas bacias voadoras. Não acredito que dentro de um Universo totalmente infinito possa acontecer a coincidência de duas civilizações viáveis trombarem uma com a outra.

 

VF: Como compositor de jingles você criou um dos jargões mais conhecidos em todos os tempos, que foi o “vem pra Caixa, você também”, para a Caixa Econômica Federal. Você trabalha com a criação de Jingles atualmente?

Sá: Só em projetos especiais que sejam financeiramente compensadores. Ou excepcionalmente inteligentes.

 

VF: Como você vê a revolução da internet na música, bem como os lançamentos de novos formatos como o CD, o MP3, MP4, o dvd e outros recursos que a gente jamais sonharia naqueles empoeirados anos 70?

Sá: Tudo isso é para o bem. Nesse tipo de coisa, só o futuro faz sentido, porque facilita a confecção e barateia o acesso. Como nos adaptamos a isso tudo, é uma questão de agilidade e tirocínio.

 

VF: Alguns músicos (a exemplo do Arnaldo Batista, dos Mutantes) afirmam que, apesar do refino tecnológico que temos experimentado nestas últimas décadas, ainda preferem estúdios analógicos aos digitais; amplificadores valvulados aos transistorizados; vinil que CD. Você também pensa assim?

Sá: Cada coisa em seu lugar. É bobagem dizer que só o analógico funciona ou que só o digital funciona. Como sempre, o equilíbrio comanda. A profundidade do analógico combinada com a manuseabilidade do digital: esse é o meu voto.

 

VF: Algumas de suas letras abordam muito do íntimo humano, além de questões explicitamente existencialistas. Você tem uma religião?

Sá: Não tenho religião. Não gosto de dogmas, sejam eles políticos ou religiosos. Não acredito em deus ou deuses. Acredito na força e na espiritualidade, essa sim, inerente ao ser humano. A vida é por si só, maravilhosa. Tanto o é que o Homem acha necessário criar virtualidades para justificá-la. Por isso acredito no auto-conhecimento como o melhor motor para a realização pessoal. Quem bem se conhece melhor faz ao próximo. Mas sem auto-ajuda, hein...

 

VF: Após cerca de 20 anos de ausência, Zé Rodrix retorna e a dupla se desfaz para voltar ao trio original. Como foi para você e Guarabyra, receber o Rodrix de volta em suas gravações e apresentações?

Sá: Foi fácil... Depois de 26 anos de dupla, quem teve que se readaptar foi ele, e ele o fez com elegância e eficiência.

 

VF: Você já escreveu algum livro ou pretende ainda escrevê-lo?

Sá: Ano que vem pretendo lançar a compilação de minhas crônicas mensais na revista “Backstage”, sob o título “Cadernos de Viagem”, o que realmente elas são.

 

VF: Você me falou que o trio está em estúdio em São Paulo, gravando um novo trabalho. Já tem nome? O que você pode nos adiantar a esse respeito?

Sá: Nome só depois de gravado. É um disco de 12 músicas inéditas do trio, compostas nos últimos seis anos e contrariando o desejo das fábricas de regravarem ad nauseam o que já foi gravado e regravado.

 

VF: Sá, muito obrigado pela entrevista.

Sá: Fiquem sintonizados no meu blog (www.luizcarlossa.blogspot.com) pra saber das novidades. No YouTube, escrevam “Guarabyra” (se escreverem Sá vem um monte de S/A!) pra baixar nossos vídeos recentes. Beijos a todos vocês.

 

* Pepe Chaves é editor do jornal eletrônico Via Fanzine (www.viafanzine.jor.br).

 

- Imagens: Blog do Sá.

 

+ Luiz Carlos Sá:

 

- Visite o blog de Luiz Carlos Sá:

www.luizcarlossa.blogspot.com

 

Relacionados, no YouTube:

- Jingle da Pepsi, início dos anos 70:

http://br.youtube.com/watch?v=iX5_ai6OKp0

 

- SR&G Casa no campo/Caçador de mim/Espanhola:

http://br.youtube.com/watch?v=LspQ1OWRSD4&feature=related

 

- SR&G – Viajante

http://br.youtube.com/watch?v=kgQ63aPMN_k&feature=related

 

- Produção: Pepe Chaves.

  © Copyright 2004-2008, Pepe Arte Viva Ltda.  

 

 

 

 
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