Itaúna-MG
O escritor dos escritores
Seu nome é unanimidade
entre os escritores de Itaúna que o aponta como
o mais importante
escritor itaunense de todos os tempos. A obra de João Dornas Filho
saiu de sua cidade para
o mundo, carregada de
características marcantes do povo mineiro.
Por
Pepe CHAVES*
De
Itaúna-MG
Para
Via Fanzine
www.viafanzine.jor.br

João Dornas
Filho
1902 -
O ano de 1902 foi generoso para o antigo arraial de
Sant' Ana de São João Acima: ano
da instalação do município de Itaúna (região Centro-Oeste do Estado de
Minas Gerais) e do nascimento de um de seus mais
expressivos filhos, João Dornas dos Santos Filho, no dia 07 de agosto
daquele ano. Ele parecia predestinado a amar a
cidade que nasceu de um velho arraial, praticamente junto com ele - mesmo
se decepcionando com ela, mais tarde. Além de ter sua marca
registrada como escritor, cumprindo o papel de pesquisador, Dornas
registrou os valores culturais locais em muitos dos seus consistentes
livros publicados e, não obstante, pesquisou em larga escala os costumes,
crenças e folclore de povos das mais diversas cercanias de Minas Gerais.
Em sua extensa obra registrou
etnologias, efemérides, sem deixar de manifestar suas críticas e seu
inconformismo com a hipocrisia social de sua época.
ZÁU - João Dornas,
mais conhecido em sua época como Záu, era filho do fazendeiro João Dornas
dos Santos, um republicano, co-fundador do Clube Republicano 21 de abril,
em 1889. Dornas pai mudou-se para Sant'Ana de São João Acima (antiga
Itaúna) no início do século passado e trabalhou também, a favor da
emancipação da cidade naquela época. Era casado com Dª Maria Eugênia
Vianna Dornas e tiveram além de João, mais 11 filhos [veja foto da
família].
Amante da
literatura e da informação João Dornas Filho cursou apenas a escola
primária no grupo “Dr. Augusto Gonçalves”, o que lhe rendeu base essencial
para absorver a rica cultura que lhe viria mais tarde, fruto, sobretudo,
de sua grande curiosidade e seu desejo inato de pesquisar e registrar
pessoas e fatos. Nos anos de 1920 escreveu vários ensaios para jornais locais,
dentre eles o lendário informe cultural “Zum Zum”. Ainda na infância, trabalhou como
tipógrafo e a partir de então, tomou amor pela palavra escrita.
BELO HORIZONTE -
Nos anos de 1920
Dornas Filho mudou-se para Belo Horizonte onde foi trabalhar. Na capital
mineira pôde ter contato com a modernidade nacional daquela época. Fez
amizades com intelectuais belorizontinos e artistas de projeção nacional e
internacional.
Filho de um influente e
triunfante republicano, Dornas atuou no movimento modernista de Mário de
Andrade da década de 1920, atuando como co-editor do panfleto "Leite
Criôlo", que satirizava a recém-instalada República. Criou laços de
amizades com diversos artistas, dentre eles o renomado pintor Di Cavalcanti, que desenhou em pastel
uma caricatura de Dornas, raríssimo quadro que se encontra atualmente
sob responsabilidades da Prefeitura Municipal de Itaúna.
Caricatura de João Dornas,
baseada
em ilustração
feita por Di Cavalcanti.
Autor
desconhecido. Arquivo Via Fanzine.
ECLÉTICO -
Dornas publicou em 1936, “Itaúna – Contribuição para a
História do Município” (Gráfica Queiroz Breiner; BH-MG), verdadeiro legado
onde narra os antigos costumes dos habitantes santanenses, mostrando de forma clara e
crua pontos negativos de nossa sociedade no passado, como por exemplo, o
mau trato aos escravos por parte dos fazendeiros da região, como
também o preconceito religioso da igreja Católica para com os Luteranos,
quando estes aportaram em Itaúna. Neste mesmo trabalho, registra personalidades
notórias da velha Sant’Ana e depois Itaúna; suas diversas agremiações
culturais, seus párocos, políticos, jornais, esportes e economia, entre
outros.
Nota-se também nessa obra,
grafada em português antigo, o esmero do autor ao citar também dados
referentes aos então distritos itaunenses, hoje as prósperas cidades de Itatiaiuçu, Carmo do Cajurú e Itaguara.
CONSISTENTE LEGADO -
Nos anos seguintes, publicou
mais 12 livros com uma média de lançamento de um livro a cada dois anos,
publicando-os até o ano de 1951. Os livros seguintes foram: “Silva Jardim”
(Cia. Editora Nacional – Brasiliana, São Paulo, 1936); “Os Andradas na
História do Brasil” (Gráfica Queiroz Breiner – Belo Horizonte, 1937); “A
Escravidão no Brasil” (Civilização Brasileira S/A, - Rio de Janeiro,
1939); “Bagana Apagada” – contos (Editora Guairá, Curitiba, 1940); “A
Influência Social do Negro Brasileiro” (Caderno Azul nº 13 – Editora
Guairá, Curitiba, 1943); “Eça e Camilo” (Caderno Azul nº 21, Editora
Guairá, 1945); “Júlio Ribeiro” (Cadernos da Província nº 2 – Livraria
Cultura Brasileira Ltda – Belo Horizonte, 1945); “Antônio Torres” (Caderno
Azul nº 31 – Editora Guairá – Curitiba, 1948); “Os Ciganos em Minas
Gerais” (Movimento Editorial Panorama – Edições João Calazans – Belo
Horizonte, 1949) e “Efemérides Itaunenses” (Coleção Vila Rica – Edições
João Calazans – Belo Horizonte, 1.951). Além dos livros citados,
participou também de trabalhos coletivos, como algumas antologias
literárias, juntamente com outros autores de seu Estado. Além da pesquisa
histórica em si que sempre estava a desenvolver, escreveu artigos, contos
e poemas para diversos jornais e revistas brasileiras.
OUTRAS PARTICIPAÇÕES
-
Também a nível nacional, Dornas
participou de coletâneas literárias e teve trabalhos publicados
em revistas especializadas de História. Em sua “História de Itaúna”, o
historiador Miguel Augusto Gonçalves de Souza observou sobre uma atividade
literária de Dornas Filho, “Praticou, com competência, simultaneamente,
o jornalismo. Dirigiu, com Guilhermo César e Aquiles Vivacqua, movimento
literário reformista, através do panfleto ‘Leite Criôlo’, com grande
repercussão em Minas, Rio de Janeiro e São Paulo, ao ensejo da tumultuada
e fecunda campanha renovadora de criação da arte moderna liderada, em
âmbito nacional, por Mário de Andrade”.
ACADEMIA MINEIRA -
Em 1945 foi eleito
unanimemente à Academia Mineira de Letras, quando ocupou a cadeira nº 12,
cujo patrono é José de Alvarenga Peixoto. Segundo citação de Miguel Augusto
Gonçalves de Souza em sua obra, Dornas Filho tentou reformar o estatuto da
Academia Mineira de Letras, no sentido de que a mesma passasse a permitir
o ingresso de mulheres nos seus quadros acadêmicos, o que veio a ocorrer,
de fato, somente no ano de 1959.
DECEPÇÃO -
Segundo nos
informou certa vez o genealogista itaunense, Guaracy de Castro
Nogueira, a Fundação Maria de Castro, dirigida por ele, detém o mais
completo acervo histórico acerca de João Dornas Filho, incluindo antigos
manuscritos do historiador, doados por suas irmãs. Guaracy que conviveu com
o escritor pessoalmente, nos confidenciou sobre a predileção de
Dornas Filho pelas mulheres da cor negra, como também a decepção do
escritor com sua terra natal ao se candidatar a deputado estadual e ter
recebido pouquíssimos votos nas urnas, nos anos de 1950. Esta forte decepção teria sido o
suficiente para levar João Dornas Filho a se aborrecer com Itaúna e passar
fixar residência em Belo Horizonte, terra de sua esposa Efigênia Ondina
Xavier Dornas (o casal não teve filhos), onde viria a falecer em 11 de
dezembro de 1962, aos 60 anos de idade.
CENTENÁRIO DE NASCIMENTO -
O centenário de João Dornas Filho em 07 de agosto de
2002 passou em brancas nuvens por parte dos poderes públicos municipais em
Itaúna,
não sendo prestada nenhuma homenagem ao mais ilustre escritor da história itaunense.
Uma das poucas homenagens que a cidade lhe prestou foi colocar seu nome em
um grupo escolar fundado em 1965 e situado à avenida Getúlio Vargas, no
bairro Santo Antônio. Muito
pouco, para quem muito fez e ainda está a fazer por esta progressista cidade.
*
Pepe Chaves
é editor do jornal
Via Fanzine
(www.viafanzine.jor.br).
- Fotos:
Arquivo de
Pepe Chaves / Arquivo Via Fanzine.
-
Consultas do autor:
-
“História de Itaúna” – vol. I e II (Ed. Lit. Maciel Ltda. – Belo
Horizonte-MG, 1986),
de
Miguel Augusto G. de Souza.
- Relatos
verbais colhidos com o genealogista Guaracy de Castro Nogueira (Itaúna-MG,
2002).
- Produção:
Pepe Chaves.
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