Energia nuclear:
O exemplo da
Alemanha
A tomada de decisão
do governo alemão de deixar de usar a energia nuclear mostra
que basta
visão e vontade política para livrar um país desta fonte de energia
indesejável.
Por
Heitor Scalambrini Costa*
De
Recife-PE
Para Via
Fanzine
07/08/2012
A Alemanha foi à primeira nação industrializada a ter um
plano de abolir a energia nuclear do seu território. A data para por fim
a esta era de insegurança foi dia 29 de maio de 2011, por decisão da
coalização de governo da chanceler Ângela Merkel. Até 2022 não haverá
mais reatores nucleares neste país emblemático, particularmente para o
Brasil, que assinou em 1975 um acordo de cooperação
técnico-científico-econômico prevendo a instalação de 8 usinas nucleares
em nosso território. Juntas, as 17 usinas existentes em solo alemão que
produziam menos de 1/4 da energia alemã serão desativadas. Este exemplo
está sendo seguido, e paises como a Itália, Áustria, Suíça, Bélgica,
Japão, entre outros, já começaram a revisar suas políticas nucleares.
A tomada de decisão do governo alemão de deixar de usar a
energia nuclear mostra que basta visão e vontade política para livrar um
país desta fonte de energia indesejável, pelo perigo que representa;
suja pelos resíduos que produz, e não se sabe o que fazer com eles; e
cara, implicando em tarifas mais onerosas para o consumidor. Enquanto a
Alemanha virava a página do nuclear, técnicos e políticos brasileiros
duvidavam que este país pudesse “sobreviver” sem a nucleoeletricidade.
Os mais exaltados alegavam até que o desligamento progressivo das usinas
nucleares forçaria o país a importarem combustíveis fosseis,
contribuindo assim para o aquecimento global. Mais uma vez estes
“experts” (?) em energia mostraram o quanto estavam errados.
Passado pouco mais de um ano da decisão histórica, no dia 1
de agosto de 2012 a Associação Nacional de Energia e Água (BDEW)
anunciou que 25 % de toda energia consumida pela Alemanha no primeiro
semestre deste ano foi gerada a partir de fontes renováveis, e que todas
estas fontes registraram crescimento no período comparado a 2011, quando
representavam 17% do consumo energético total.
O setor eólico forneceu 9,2% de toda energia demandada pela
Alemanha, produzindo 24,9 bilhões de kWh, respondendo pela maior
contribuição das renováveis. A biomassa representou 5,7% da demanda,
produzindo 15,3 bilhões de kWh. E o setor fotovoltaico 5,4%. Sendo este
o que mais cresceu, 47%, aumentando sua geração do 1º semestre de 2011
de 9,8 bilhões de kWh, para igual período em 2012, de 14,4 bilhões de
kWh.
O recado parece dado para o Brasil e para o mundo. As
fontes renováveis podem e devem substituir os combustíveis fósseis, além
da indesejável energia nuclear.
No Brasil, apesar do crescimento das instalações eólicas,
ainda sua participação na demanda energética é pífia, menos que 2%.
Apesar de todo o estardalhaço midiático que governos estaduais e federal
fazem, as políticas de incentivo desta fonte de energia ainda são
pontuais e pouco expressivas diante do enorme potencial estimado de mais
de 350 GW. O caso mais bizarro, que demonstra na prática a falta de
interesse, diz respeito ao atraso incompreensível, na atualização do
Atlas Eólico Brasileiro de responsabilidade do Centro de Pesquisas da
Eletrobrás (CEPEL), instrumento imprescindível para atração de novas
instalações.
Com relação aos agrocombustíveis, mesmo com a propaganda
encantando o mundo, em torno da produção do etanol e do agrodiesel, a
realidade é outra. Etanol está sendo importado, e o preço se aproximando
mais e mais da gasolina, resultando numa retração do consumo. E em
relação à propalada e alardeada alavancagem da agricultura familiar, com
as oleaginosas (quem não lembra dos discursos pró-mamona na região
nordeste como redenção dos pequenos agricultores) para a fabricação do
agrodiesel, nada aconteceu. Hoje mais de 3/4 da produção do agrodiesel é
oriunda da soja.
Sobre a energia solar fotovoltaica, nem se fala. Mesmo
tendo alguns projetos privados implantados nas arenas esportivas, e uma
usina de 1 MW no interior do Ceará, continua sendo apenas “traço” na
matriz energética nacional. Existe uma expectativa com a resolução da
Aneel 482/2012 de 17 de abril ultimo, estabelecendo o acesso da pequena
geração distribuída na rede elétrica, e assim estimular a energia
fotovoltaica instalada em domicílios e pequenos comércios. Mesmo com
mais de 20 anos de atraso em relação à Alemanha que lançou o projeto
“1000 telhados solares” em 1991, no nosso caso “a esperança é a última
que morre”. O aquecimento solar da água ainda patina com a iniciativa
“Cidades Solares”, legislação municipal que atende hoje a menos de 50
municípios brasileiros. E o programa “Minha Casa, Minha Vida”,
incorporando sistemas de aquecimento solar, ainda é uma incógnita.
O Brasil é bem ensolarado, possui muita água, fortes ventos
e grandes áreas agrícolas para a produção da biomassa, podendo utilizar
tudo isso para seu desenvolvimento e assim melhorar a qualidade de vida
de sua população respeitando o meio ambiente. Que pais é este que opta
pela energia nuclear, combustíveis fósseis e mega-hidrelétricas na
região Amazônica?
* Heitor Scalambrini Costa é professor Universidade Federal de
Pernambuco.
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